quarta-feira, 17 de março de 2010

O jeito do Juiz-forano falar


Dexa eu ixplicar, para intender. Depois que eu cumer e durmir, dexa que eu pego a caxa que o fregueis quer”. Este é jeito de falar do mineiro da zona da mata, mais conhecido como “mineirês” e impossível de não ser reconhecido em qualquer parte do país. O dialeto mineiro foi objeto de estudo da professora da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Patrícia Fabiane Lacerda. PesquisaA pesquisa começou ainda na fase de graduação, em conjunto com o professoraposentado pela UFJF, Mário Roberto Zágari (co-autor da obra “Esboço de um atlas linguístico de Minas Gerais”) e que prosseguiu no período de pós-doutorado, realizado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), quando Patrícia teve a oportunidade de realizar um trabalho voltado especificamente para a língua portuguesa falada em Juiz de Fora. Com base na pesquisa realizada, foi verificado indícios de que algumas particularidades fonéticas do falar juizforano são decorrentes da grande presença de escravos de origem Banta na cidade, durante o século XIX. Essas peculiaridades são entendidas pela lingüística como alteamento da vogal pretônica, como a utilização das vogais ‘i’ no lugar de ‘e’ e ‘u’ no lugar de ‘o’, por exemplo, quando se diz “pulícia” (polícia), “cumer” (comer), “durmir” (dormir), “ixplicar” (explicar) e “intender” (entender). Outros casos, chamados de monotongação do ditongo, em que os encontros vocálicos são reduzidos a uma vogal apenas, como em louco (“loco”), touro (“toro”), caixa (“caxa”) e deixa (“dexa”). Por fim, outra característica principal seria a ditongação de sibililante, em casos como três (“treis”); freguês (“fregueis”) e xadrez (“xadreiz”). Em sua pesquisa, a professora defende a ideia de que a língua portuguesa documentada no século XIX em Juiz de Fora pode representar a fala que efetivamente caracteriza a Zona da Mata Mineira durante o período, já que a cidade atuou como centro aglutinador de todo o crescimento a partir de sua integração ao Circuito do Caminho Novo. Para tanto, sua equipe utilizou-se de análise de documentos históricos organizados e disponibilizados pelo Arquivo Histórico da Prefeitura de Juiz de Fora, de forma a conhecer a grafia e também a fala daquela época.Sotaques mineirosO estudo do professor Mário Zágari foi fundamental na execução da pesquisa , de acordo com a professora. Em seu trabalho, ele aponta a existência de três tipos de falas que compõem o sotaque mineiro: o falar baiano, partindo do Norte de Minas até a linha no sentido Leste-Oeste; o falar paulista, partindo do Sul do estado em rumo ao Norte e dobrando para o Oeste, indo em direção ao Triângulo Mineiro; por fim, o falar mineiro, próprio da Zona da Mata Mineira e da região do Campo das Vertentes. De acordo com as pesquisas realizadas, a fala da capital, Belo Horizonte, não se enquadra nessas classificações, pois se caracteriza como um falar próprio._ Algumas variedades linguísticas são bastante estigmatizadas. Isso é comum em todos os povos. Minha intenção foi fazer um resgate histórico sobre esta variedade linguística dentro de Juiz de Fora. O falar é fruto da cultura e da formação histórica de um povo, portanto, o juiz-forano não deve ter vergonha de seu sotaque, pois ele faz parte de sua identidade. _ analisa Patrícia. Pesquisa em sitePara divulgar a pesquisa foi construído um site, em funcionamento desde novembro do ano passado e com aproximadamente mil acessos. Lá, estão disponibilizados alguns dos capítulos do relatório final de pós-doutorado.O endereço é http://www.linguaportuguesajf.com.br/